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As Bibliotecas
Escolares e os Centros de Recursos:
uma discussão mais urgente do que actual
Ana Maria Pessoa
ESE Setúbal
No número de Março da
Revista Proformar online encontramos um (excelente e actual)
conjunto de reflexões sobre as bibliotecas escolares e os
centros de recursos. Elas passam, entre muitas e muitas
outras, pelos apoios institucionais públicos e privados, pela
(in)definição dos ditos conceitos, objectivos, recursos
materiais e humanos, escolas e formação de professores,
actividades lectivas e produções de alunas(os) e
professoras(es) envolvidas(os)...
Porque o tema parece inesgotável, seria impossível
colocar, num texto que se quer breve, todos os ‘links’ que
gostaríamos de estabelecer com os referidos artigos; por isso,
vamos focar a nossa atenção apenas num tópico: a importância
de uma biblioteca escolar ou centro de recursos numa escola e
relações que ela pode/deve criar com a chamada “comunidade”.
O discurso sobre “auto-aprendizagem”, “produção de
conhecimentos”, “trabalho autónomo” e muitos outros termos ou
(conceitos?), porque já integrados em muitos e desvairados
discursos, deixou de ter qualquer significado quando se trata
do tema que aqui nos prende. Todas(os) sabemos que as(os)
alunas(os) devem pesquisar, informar-se, enfim, produzir
conhecimento. Também todas(os) sabemos que, salvo poucas
excepções (que se contam já por muitos milhares e nos quais
incluímos todas as experiências referidas no número da
supracitada revista), a maior parte das nossas escolas tem
ainda um quotidiano de sala de aula muito centrado nas
actividades dos docentes. Bem gostaríamos de dizer que isto é
mentira mas...a realidade desmente a nossa vontade de a ver
com outros olhos. Talvez devêssemos dizer de outro modo: as(os)
alunas(os) realizam em sala de aula actividades muito
diferentes mas... a sua avaliação...
Qualquer escola que se preze tem hoje uma biblioteca
escolar ou um centro de recursos que se pretende bem
apetrechado para apoiar o desenvolvimento do ‘gosto pela
leitura’, o currículo oficial, a ‘articulação com a
comunidade’ e o ‘meio’ envolvente... Sinceramente, parece-nos
que estas e outras expressões foram já tão usadas, gastas e
desvirtuadas que não sabemos bem o que cada um de nós entende
ser o seu significado. Por tal motivo não podemos deixar de
estar de acordo com aquele professor (Rebelo, 2005) que sonha
com o dia em que, em todas as bibliotecas escolares, a
organização técnica da documentação seja posta em segundo
plano em relação às possibilidades da sua utilização
pedagógica. Como se vê, só aqui teríamos já uma discussão bem
interessante para professoras(es) mas talvez muito árida para
todas(os) aquelas(es) alunas(os) para quem o que interessa é
que o que lá podem ir buscar ou deixar e não a forma como lá
foi colocado...
Também temos sempre defendido, como é feito em vários
dos artigos publicados naquela revista online, que as
bibliotecas escolares e os centros de recursos devem servir a
escola onde vivem: estando apetrechadas(os) com o que é
necessário para a ‘boa’ consecução dos currículos e de todas
as actividades não-curriculares, dando-se a conhecer a
todas(os) professoras(es) que nela trabalham, captando os
apoios de todas(os) as(os) Encarregados de Educação e
estabelecendo as melhores ligações com o ‘meio’ envolvente.
Este inclui o quê?
O Ministério da Educação que decide, para todas as
escolas? por igual? da maior parte das questões educativas?
Que quer as escolas em rede, mas qual? A rede da comunicação
virtual ou a rede de comunicação real que ‘encrava’ a toda a
hora por falta de meios informáticos? O Gabinete da Rede de
Bibliotecas Escolares que apoia todas as escolas? ou só
algumas que têm a “(...) felicidade (...)” de serem
seleccionadas (Miranda, 2005)? Estamos a falar de um ensino
público ou vários? A Rede das Bibliotecas Escolares –
www.dapp.min_edu.pt/rbe/ que promove concursos entre escolas
para terem aquilo que deve existir em todas ou introduzimos
nelas o princípio dos ‘rankings’? ou o da meritocracia? As
autarquias locais que, desde 1987, têm a responsabilidade pela
leitura pública? Mas o que quer isto dizer? Como fazem esse
trabalho: virando-se para toda a população que é suposto
servirem ou escolhendo, dentro dela, um grupo específico - a
população escolar activa? E que fazem com a outra, por
exemplo, com os quase 50% de estudantes que abandonam o
secundário? Quando criam, nesta área, os “SABE”- Serviços de
Apoio a Bibliotecas Escolares - fazem-no porque a esses
serviços cabe a parceria na definição de políticas locais de
leitura ou para “(...) promover a articulação e ajudar as
bibliotecas escolares a tirar o melhor proveito possível dessa
mais valia(...)”(Nunes, 2005)? ‘Ajudar’ significa igualdade
entre intervenientes, supremacia da organização documental
sobre a utilização pedagógica ou o quê ainda?
Falta referir também a comunidade das(os)
professoras(es) que, por esse país, dão “(...) fora do horário
lectivo directo(...)”(Miranda, 2005) muitas e muitas horas
para projectos tipo “Xeque-mate”. Elas(es) fazem ainda
formação, formação, formação, sobretudo ‘contínua’, nestas
áreas: nas escolas, nos Agrupamentos, através da Rede de
Bibliotecas Escolares, em instituições de Ensino Superior
Público e Privado – tipo ESE de Setúbal, de Viseu, de Lisboa
ou João de Deus - ou também, numa recente iniciativa da
Fundação Calouste Gulbenkian – veja-se www.gulbenkian.pt/projectos_especiais/
ou www.theka.org. que já apoia quase uma centena de escolas ou
ainda em Projectos como Nónio e muitos outros relacionados com
as TIC. Muita dessa formação não ‘dá’ diploma académico, outra
‘dá’, outra é gratuita como a da Fundação Gulkbenkian, outra é
reconhecida pelas escolas e entrega-se a essas(es)
professoras(es) a coordenação desses sectores da Escola outra
não o é, isto para não referir, de momento, a formação e a
prática das(os) formadoras(es) de todas essas ‘formações’.
Não nos alongaremos mais. Começámos a enumeração,
propositadamente confusa, ou o ‘brain storming’ atabalhoado
desta meia dúzia de problemas entre as centenas de que hoje se
reveste a discussão sobre bibliotecas escolares e centros de
recursos. Esta listagem, demasiado incompleta, servirá apenas
como um pequeno contributo para que se inicie, num país que se
diz pobre mas que vive melhor do que os mais ricos nesta área,
um debate mais urgente do que actual. Todas(os) as(os) que
estão fora dele exigem isso a todas(os) nós. Uma última
sugestão: deitemos mais dados para este saco, sacudamo-los e,
depois peguemos numa ponta e iniciemos uma discussão coerente,
objectiva, séria, fundamentada. O desnorte sempre se pagou
muito caro e, em educação, tem sido mesmo fatal. A “saturação
da informação” também!
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